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quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

RICARDO DE BENEDICTIS - ARTIGO

VALE DE LÁGRIMAS E IMPUNIDADE
Ricardo De Benedictis
Seis diretores da Vale receberam 30 milhões de reais de bônus, fora seus altos salários em 2018. Isto quer dizer que a empresa assassina os brasileiros em Mariana e agora repete os crimes em Brumadinho, totalmente impune. E seus diretores ainda são premiados! Uma maravilha este nosso Brasil.
Na tragédia de Mariana, a Vale não pagou até esta data, nem um centavo dos 800 milhões de reais de multas que o inofensivo IBAMA lhe aplicou, muito menos 1 bilhão de reais que a Justiça determinou. Imediatamente, a assassina, que destruiu 19 vidas e acabou com o sossego de mais de 200 famílias em Mariana, paga míseros salários mínimos e ‘aluguel social’ para os desabrigados. E acha que tudo está bem. Destruiu um rio caudaloso, o Rio Doce e os arredores de milhões de habitantes em suas margens, inclusive deixando infértil todo o vale do rio que lhe empresta o nome e que nunca mais vai valer alguma coisa, com suas águas poluídas e peixes mortos, populações mortas de fome e desabrigadas. Até o santuário de Abrolhos, na Bahia foi atingido pela maldita lama com toda sorte de rejeitos do minério por ela extraídos sem o mínimo respeito à vida. Que fez o governo? Nada!!!
Agora a tragédia vem inexorável e ameaça atingir o nosso rio São Francisco. Na China, de regime comunista, estes assassinos seriam fuzilados. Aqui, prendem-se 5 bodes expiatórios de terceiro escalão e o presidente falastrão, que deveria estar na cadeia, posa de bonzinho, porque vai dar de esmola 100 mil reais a cada família atingida. Maravilha!
As turbinas da hidroelétrica foram preventivamente desligadas para evitar que os rejeitos cheguem à grande Hidrelétrica de 3 Marias, aí sim, decretando a morte do nosso ‘velho chico’, que a incúria do brasileiro tenta matar há séculos e não consegue. Aí está a oportunidade de acabar com esse velho rabugento. Prá que rio? Prá que Nordeste?
Vamos detonar logo o rio Negro e Solimões. Prá que esta besteira de preservar matas ciliares? Prá que o mar? Vamos fazer o que os paulistas e cariocas vêm fazendo: tome esgoto o lixo nas praias e nos rios!!!
Minha gente, o nosso país preocupa-se com coisas mais importantes. Enriquecer os ladrões que mandam nos sucessivos governos, desde Cabral, enriquecer e enriquecer. Comida pouca, meu pirão primeiro e viva o Crime, eis o lema da bandidagem que se apossou do Brasil, há séculos!

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

BIG BEN - CRÔNICA

A obra-prima das mãos de Deus!
BIG BEN
A criatura humana precisa parar de arrumar culpados para seus
infortúnios. O x da questão é: a "encrenca" não vem de fora, mas  sim se processa dentro da sua cuca, melhor dizendo, da sua mente. Cada mente é senhora das suas próprias tragédias ou glórias. Ou seja: A mente é tudo! Está tudo na mente! Luz, trevas, paz, guerra, vitória, derrota, felicidade, sofrimento, saúde, doença, coragem, medo, esperança, desespero, erro, verdade, dúvida, fé, amor, ódio, vida e morte.

Não existe realidade para a mente, apenas abstrações que não têm existência própria. Ela constrói a sua "pseudo-realidade" de acordo com suas realidades condicionadas. Isto é, você está nas "mãos da sua mente"! Condenado, pelos restos de seus dias, a vir-lhe prestar reverência e obediência.

Sinto muito em dizer isso, mas o seu "livro da vida" não passa de um  mero enredo construído pela "Grande Escritora", a sua mente. -Então, o que fazer? - Posso tentar ajudá-lo? Como toda criatura viva, a mente precisa de aprendizado e adestramento. Portanto, é preciso tomar muito cuidado com o que você irá dar para ela se entreter. Outra coisa importante: a mente não gosta dos ensinamentos simples, mas sim das coisas complicadas. Isto a faz ganhar "músculos", crescer, e faz toda a diferença. Ela é simplesmente apaixonada por enigmas e experimentações. Gosta de navegar em águas desconhecidas, ainda não mapeadas.

Adivinhe quem foi a autora do maior livro de todos os tempos? Adivinhe quem foi a protagonista da maior guerra de todos os tempos? -Preciso responder? Tudo é fruto da imaginação e inventividade dessa "cascata de reações sensoriais" que atende pelo nome de "mente". Sem dúvida nenhuma, ela é a  "obra-prima das mãos de Deus"!

NANDO DA COSTA LIMA - CONTO

BOTO TEM EM TODO CANTO
Nando da Costa Lima
 Dona Salustiana, uma matrona braba dos anos 1930, levou a afilhada pro porão do casarão, e indagou:
— E agora, Docarmo, o que eu vou falar pra sua avó que me confiou você? Você vai ter que falar quem te embuchou, senão as coisas vão piorar pra você. Fala o nome do safado. Foi Joaquinzão do acarajé? Neco da padaria?
— Posso falar não, madrinha. Nem que eu morra! Não conto pra ninguém.
— Ué, menina, quer dizer que você prefere sofrer sozinha só pra proteger um sacana. Ele é casado?
— Eu já disse, madrinha. Da minha boca não sai um “a”.
— E pra seu pai, aquele ignorante, como é que você vai se arranjar? Ele vai querer saber nem que seja de baixo de pau. Você conhece a ignorância de Profírio mais que eu, foi até por isso que você veio morar comigo e Miguidônio. Por falar nele, meu marido ta pra endoidar. Como é que ele vai explicar essa situação pra seu pai, tão ignorante... Vai acabar acontecendo coisa ruim, ali é a tampa e a panela da estupidez.
—Fale isso não, madrinha. Parece que a senhora ta querendo ver sangue.
— Me respeite, sua desqualificada. Você faz coisa errada e ainda tem coragem de falar desaforo pra mim. Quando  eu falei que não ia dar nada que presta, é porque eu conheço os dois, e sei que na hora que ficarem sabendo quem foi o responsável por sua perdição. Se for solteiro, vai ter que casar  na raça... Mas se for casado, ta lascado.
— É por isso que eu jurei que não conto pra ninguém, nem se mãe fosse viva eu contaria.
— Eu já vi que esse filho da puta deve ter te ameaçado. Isso só piora a situação dele, nem precisa ser advinhona pra saber que é homem casado...
— A senhora é muito boa comigo, mas está me julgando sem provas. Se eu contar a verdade pra senhora, vai contar pro resto da parentada? Vai deixar eu ir embora pra Sompaulo antes de pai chegar?
—Ué, por que resolveucontarassim de uma hora praoutra?
— É que a senhora é uma mulher letrada e vai entender logo.
—Fugir por que? Se você vai me contar tudo, eu posso resolver o resto. Quem vai pagar é o peste que conseguiu tirar sua caçola de botão nos lados. Desembucha, eu já to pra morrer de curiosidade. Quem foi o filho da égua que te passou pra trás? Tá pensando que aqui não tem lei? Deixa Miguidônio ficar sabendo!
—Tá bom, madrinha, eu vou abrir o jogo. A senhora como professora vai entender e contar pra estas almas sebosas que vão me crucificar na língua.
— Ô, Docarmo. Cê ta querendo me enrolar? Parece até que ainda táimaginando uma história pra poder contar.
— A senhora sabe que eu detesto mentira. Posso ser qualquer coisa, menos mentirosa.
— Então desembucha, eu já to ficando nervosa. Traz logo minha pomada pra morroida... E conta tudo pra sua madrinha.
— A senhora então senta que eu vou falar de vez.
—Fala logo, trem ruim.
—Foi o “Boto” que me seduziu, madrinha.
— Mas Docarmo, em pleno século XX você quer que eu acredite e ainda convença o resto da família que quem lhe emprenhou foi o boto. Parece até que não sabe que o boto é um peixe que só tem lá pros lados da Amazônia. Se fosse o tarado da Normal lá de Conquista, eu até podia fingir que acreditei.
— Eu sei, madrinha...
— E onde é que esse boto foi achar água pra viver aqui nesse caatingão, tem mais de um ano que não chove. Toma vergonha na cara, menina. Me conta a verdade ou eu vou apelar pra palmatória. Cê sabe que nem meu marido escapa dela.
—Tá bom, madrinha. Eu queria resolver as coisas de um jeito mais fácil, a senhora sabida do jeito que é ia convencer todo mundo que foi o boto. Erá só inventar que aqui na caatinga, quando secam as lagoas e os riachos, o boto se transforma em gente e só desvira quando vê um açude sangrando. Mas como a senhora quer a verdade, lá vai: madrinha, quem me embuchou foi o padrinho Miguidônio, seu marido. Até a ideia de dizer que foi o boto foi dele, disse que a senhora acreditava em tudo.
— É melhor você tirar o nome de Miguidônio dessa enrola, sua desalmada. Eu pensei direito e vi que foi o boto. Deve ter sido naquele dia que eu e Miguidônio lhe levamos pra conhecer o aguão de Conquista. Eu lembro que CE já voltou de lá com a cabeça na lua. Pode deixar que assim que eu te despachar pra Sompaulo, conto pro resto da família... Boto filho da puta, esse eu faço questão de castigar
Dona Salustiana tava se queimando por dentro. Sabia que o culpado era o sacana do marido. Fez aquilo e ainda mandou a afilhada vir com história de boto... Ele tava se vingando do tempo em que ela era a mulher mais bonita da cidade. Ele sabe que naquele tempo era só chegar um dotô novo na cidade que ela era a primeira a se consultar. Só parou quando o último cobrou a consulta e falou que não precisava voltar. Aí que ela viu que o tempo gosta de aprontar. Miguidônio sabia de tudo, mas era frio igual uma barata. Também, com o tanto de dinheiro que o pai de Salustiana tinha. Sem falar da valentia... Não foi uma nem duas vezes em que Miguidônio teve que ficar calado e vermelho igual a um peru. Era só o sogro falar que a filha dele ficava viúva, mas não separava. E era mesmo, tinha duas cunhadas viúvas e ninguém nunca falava dos finados maridos.
E foi depois de muito matutar é que dona Salustiana viu que era melhor colocar a culpa no boto. Criou o menino como se fosse seu neto, a afilhada nem precisou viajar... Só Miguidônio que se lascou: depois daquilo dona Salustiana, além de não permitir que ele entrasse no casarão e só andasse de cueca, mandou fazer uma lagoa murada no fundo da sede e seu Miguidônio era obrigado e ficar dentro o dia quase todo. A mulher mandou ele escolher: quer virar defunto ou quer virar boto até o fim dos seus dias? Miguidônio aceitou a 2ª opção, mas não durou muito tempo. Os jagunços que ficavam tomando conta não deixavam ele ficar mais de duas horas fora d’água. “Ordem de madrinha Salustiana”.  Sem contar o terço das seis horas que ela rezava todo dia pra ele tomar vergonha e virar gente. Não era nem um terço que ela rezava, era um rosario. E nessas horas, lá na “Lagoa do Boto”, ele era obrigado a ficar ajoelhado em cima dum rochedo até acabar a reza...
Morreu tuberculoso, mas antes de morrer, devido aos maus tratos, ficou “aluado”, ele próprio achava que era oboto. No dia de sua morte,dona Salustiana, além de deixar correr uma lágrima (de raiva), rezou pra mais de dez “ruzaro” pro boto caatingueiro ir parar no meio do inferno. Ficou tão desgostosa com essa história que acabou morrendo. E até hoje, todo mundo que passa em frente ao velho casarão, vai logo falando: “Aqui era a casa da viúva do boto”. E dona Salustiana morreu pensando que ninguém sabia quem era o boto que abusou de sua afilhada.

JEREMIAS MACÁRIO - CRÔNICA

O POVO DE BOQUIRA ENCURRALADO POR UMA MINA
JEREMIAS MACÁRIO
Com base num fato real de uma matéria jornalística realizada no auge pesado da ditadura civil-militar de 1974 pelo jornal “Estado de São Paulo”, proibida de ser divulgada, o assunto virou livro “Boquira”, numa reportagem romanceada a partir da pena ligeira e denunciativa do amigo-companheiro jornalista Carlos Navarro Filho, que na época chefiava a Sucursal do periódico, em Salvador.
  O relato é a fiel voz de desabafo de um povo do interior do sertão baiano que sofreu todo tipo de opressão de uma companhia multinacional de mineração e que dava toda cobertura ao regime militar em troca de benesses dos governos dos generais Médici e Geisel. A empresa tinha suas influências políticas até em Vitória da Conquista onde Renato Rebouças possuía participações em muitas decisões.
   Naquele período já era repórter de economia do jornal “A Tarde” e conheci o dinâmico, competente e irrequieto colega Navarro em algumas andanças de coberturas, inclusive feitas em outros estados. Em meu livro “Uma Conquista Cassada” faço algumas referências ao caso “Boquira” e sua prestação de serviços à ditadura na captura do capitão Carlos Lamarca.
A obra começa com um comentário fidedigno do repórter Biaggio Talento sobre o ambiente redacional barulhento, insalubre e “fumacê” dos jornais daquele tempo, e as dificuldades para se passar um texto do interior. Sou como meu amigo Carlos Gonzalez da mesma geração das máquinas de escrever, do teletipo e do aparelho de telefoto que enviava as imagens reveladas num laboratório para filmes.
  Para matar as saudades, concordo com Paolo Marconi, no prefácio, quando disse que “fomos felizes e não sabíamos”. Lembra ele do respeitado Jornal do Brasil e os tradicionais Estado de São Paulo, Folha de São Paulo e o Globo, bem como do famigerado Ato Institucional no 5. As críticas não podiam ser nem construtivas, mas elogiosas, como retrucou o marechal Arthur da Costa e Silva para os editores do JB.
  Para Marconi, o livro é produto de uma desforra de quem viu seu jornal não publicar uma grande reportagem sobre Boquira/Cobrac – Companhia Brasileira de Chumbo, subsidiária da francesa Penãrroya Oxide S.A. Foi, na verdade, uma censura interna. “O livro é de denúncia e ainda atual por mais estranho que possa parecer”. Depois de paralisar a extração em 1992 em Boquira e fechar a fábrica de lingotes de chumbo em Santo Amaro, a Cobrac deixou um dos maiores passivos ambientais da história da mineração do país.  A Samarco, em Minas Gerais, talvez tenha superado em termos de danos.
 Em redor da mina e margeando o município de Boquira, Marconi calcula que existam mais de seis milhões de toneladas de resíduos, sem qualquer contenção. Em Santo Amaro estão hoje 490 mil toneladas de material contaminado, com metais pesados. Os órgãos de controle ambiental tentam, desde 1993, condenar a Penãrroya. A primeira sentença condenatória foi proferida em 2014. Mesmo assim, em janeiro de 2016 houve recurso da ré.
O PADRE AVARENTO
   Na narração de Navarro, em sua história “Boquira”, que tanto mal fez ao povo do povoado de poucas casas, tudo começou no ano de 1954 com o padre Nazário, um descontente com sua situação de pobreza, saindo de Oliveira dos Brejinhos com destino à fazenda Pajeú, em Boquira, para dar a extrema-unção à idosa Neusina de Filó.
Ele descreve o cenário de calor infernal do sertão. Padre Nazário é um avarento e passa pelo Morro do Pelado onde se esbarra com, seu guia Codó, com pepitas gigantes. Imagina que as pedras são ouro puro e não esquece do que viu na terra de pessoas ingênuas e ignorantes.
  Na volta, ele recolhe amostras das pedras brilhantes que só serviam para fazer cercas de mureta para não deixar animal escapar. Aquela extrema-unção um dia veio a mudar a vida de toda aquela gente de Boquira. Dali em diante o estado de espírito do padre se renovara e atendia a todos com satisfação em Macaúbas e vizinhança. Aguardava ansioso a chegada do seu amigo farmacêutico Agenor, para levar as pedras para exame em Salvador.
Tudo calculado na sua mente traiçoeira. Três semanas depois o amigo retornou e o resultado dava alto teor de chumbo, mas as pedras careciam de exames mais precisos a serem feitos em São Paulo. O padre malandro continuava a celebrar suas missas em Macaúbas, mas sonhava ficar rico. Passou a namorar a filha do Agenor que dava uma de médico charlatão.
Em 1955, os dois começaram a tirar minério de Boquira no lombo de burro. Tempos depois Nazário tornou-se pequeno sócio da grande empresa e ficou rico em 1965. Passou a explorar outras áreas enganando os tabaréus e repassando o domínio por milhões à multinacional. Certo dia reapareceu em Boquira num jipe sem falar com ninguém e foi direto para o Morro do Pelado onde encheu o carro com grandes pedras, para exames no sul. Deu fraco, mas não desistiu. Voltou a pegar mais pedras e dessa vez deu galena viva, puro chumbo.
  A partir daí, passou a frequentar mais o povoado, agradar o povo e a celebrar missa todos os domingos. Foi aí que armou a trama. No sermão dizia que precisava de assinaturas do povo para um abaixo-assinado a ser levado ao governo, para construir uma igreja nova. Foi nessa safadeza que passou a perna em todo mundo.
COMPROU TODO MUNDO
  Com as assinaturas, procurou um advogado em Salvador e requereu usucapião da área, incluindo serras vizinhas com todos os poderes passados em nome dele pelos moradores. Foi vender ações no estrangeiro. O maior comprador foi o doutor Linus, o pistoleiro da companhia. Qualquer advogado era comprado pela empresa.
  Como sempre acontece, a mineradora passou a agradar o povo com besteiras, como caminhão de cervejas, jogos de futebol com times do Rio de Janeiro, emprestar dinheiro e fazer churrascos com as piores partes dos bois. O prefeito foi comprado e todos aqueles que apareciam em defesa da população. Mesmo quem tinha documentos da terra perdia para o advogado baiano Armando da Silveira, que antes foi contratado para defender os proprietários e tornou-se parceiro da Mineração Boquira.
  A reportagem registra vários depoimentos queixosos dos que perderam tudo para o padre e o Agenor que, com seus capangas, destruíram roças e pastagens. “Mandam a polícia, pegam os proprietários, prendem e dão até bolo. Essa companhia só tem brutalidade. O padre tirou a batina e não foi condenado a nada” – desabafou um entrevistado.
  As matérias foram feitas pelo fotógrafo Bel e o repórter de redação Dailton, que foram ameaçados e tiveram que deixar o local às pressas, mas com uma boa colheita de dados. Em seu livro, Navarro pinta o cenário daquela época ditatorial e dos jornalistas que acreditavam mudar o mundo, denunciando crimes, prisões ilegais, corrupção, grilagens no oeste, tortura e morte, mas eram amordaçados pela censura.
  A mineradora tinha seus prepostos militares que reprimiam qualquer manifestação, e vigiavam o Núcleo de Assistência Rural de Boquira. Quando o negócio começou a apertar, os repórteres foram aconselhados por Linus, o coronel reformado da PM, a deixar a cidade.
  Além de Santo Amaro, parte da produção do minério era transportado para o Paraná, e a companhia praticava contrabando de ouro, prata e sonegação fiscal, conforme levantamento da equipe do jornal “Estadão”. Com mão de ferro,a empresa mantinha o controle opressor da população.
  A reportagem incluiu levantamentos extraídos até na França, país de origem da multinacional, que tinha um dos braços da mineração em Salvador, Curitiba, São Paulo e Brasília. O regime militar monitorava tudo e recebia seus dividendos da companhia, que comprou todos em Boquira.
   Mesmo assim, depois de tudo pronto nas apurações, o “Estadão” ainda publicou a primeira matéria, mas o editor francês do jornal impediu que as demais fossem divulgadas. Como o trabalho foi feito em conjunto com o Diário de Notícias e o Jornal da Bahia, só os baianos fizeram as denúncias.
  Em sua obra romanceada, mas verdadeira, com sua linguagem atrativa que prende o leitor do início ao fim, Navarro conta todos detalhes das armações praticadas pela mineradora em Boquira, inclusive assassinatos, linchamentos e torturas. Aponta os personagens das arbitrariedades criminosas, e cita asvítimas dos carrascos dos moradores.
Descreve, por exemplo, a história de João Mega, um dos donos do Morro do Pelado, que foi lesado pelo padre Nazário. No seu desabafo, disse: “Mate um homem, mas não desmoralize ele que pode virar um filho do cabrunco e cometer barbaridades, ou pode se amofinar e morrer um tantinho a cada dia”... Para Navarro, João Mega sofria da dor de dentro e morria de morte doída. Eram os pistoleiros matando, a água contaminada e os adversários da mina acuados.
  Na sua expressão de revolta, o autor de “Boquira” chega a afirmar que a empresa controla os negócios, a saúde, a polícia, os órgãos públicos e a igreja, exceção de Jesus Cristo, “porque aqui ele nunca botou os pés”. A mina bota prefeito e tira prefeito. A CPI do Congresso apontou vários crimes cometidos pela companhia (sonegação fiscal, contrabando, mortes), mas não aconteceu nada.
  Por fim, o jornalista Navarro faz um histórico sobre as origens do povoado de Boquira e como seu povo simples sempre foi ludibriado pelos mais fortes, culminando com a chegada da mineradora. Destaca todo o aparato montado pelas forças armadas e pelo delegado Fleury na região (Brotas de Macaúbas, Oliveira dos Brejinhos e Boquira), com todo apoio logístico da mineradora, para capturar e matar Carlos Lamarca e seu companheiro Zequinha. “Os gringos vindos dos quintos dos infernos cometeram barbaridades”- protestou João Mega. 

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

JEREMIAS MACÁRIO - HISTÓRIA

OS GRANDES IMPERADORES, A DEPRAVAÇÃO

 E A DECADÊNCIA DO IMPÉRIO ROMANO (I)
Jeremias Macário
Reza a lenda que quando os gregos Menelau, Ulisses e Aquiles conquistaram Tróia, na Ásia Menor, um dos poucos defensores a se salvar foi Enéias, cuja mãe era a deusa Venus-Afrodite. Ele andou perambulando com sua mala ao lombo até alcançar o Lácio, no norte da Itália. Casou-se com Lavínia, filha do rei Latino, onde fundou uma cidade com o mesmo nome da mulher.
  Seu filho Ascânio fundou Alba Longa, a nova capital. Depois de 200 anos, Numitor e Amúlio, descendentes de Enéias, ainda ocupavam o trono do Lácio. Um dia Amúlio expulsou seu irmão e matou todos seus filhos, menos Réia Sílvia, mas obrigou-a a se tornar sacerdotisa da deusa Vesta para não ter filho.
 Num dia bem quente resolveu tomar um ar fresco e adormeceu. Numa das suas descidas à terra, Marte a viu, apaixonou-se por ela e a engravidou. Amúlio ficou muito zangado, mas esperou que ela desse à luz e nasceram dois meninos gêmeos. Depois fez Sílvia colocá-los num barco e deixou-os à deriva na correnteza do mar. A embarcação encalhou nas areais e uma loba os acolheu dando do seu leite.
 Esse animal tornou-se depois símbolo de Roma, mas muitos dizem que se tratava de uma mulher com o nome de Acca Larentia, chamada Loba pelo seu caráter selvático e infiel ao seu marido pastor. Os dois receberam os nomes de Rômulo e Remo. Depois de crescidos, voltaram a Alba Longa, mataram Amúlio e recolocaram Numitor no trono.
 Depois de tudo resolveram construir um novo reino em meio às colinas onde corre o Tibre. Ali começaram a discutir sobre o nome a ser dado à cidade. No impasse, decidiram que venceria quem visse mais pássaros. Remo viu seis sobre o Aventino e Rômulo 12 sobre o Palatino. Foi colocado o nome de Roma e, em torno dela,edificaram muralhas. Remo achou frágeis e com um chute colocou um pedaço abaixo. Em represália à sua conduta, Rômulo abateu o irmão com um golpe de enxada.
  Tudo isso, segundo o historiador Indro Montanelli, em “História de Roma”, aconteceu por volta de 753 a.C.(21 de abril). As terras trabalhadas por Remo e Rômulo se tornaram o centro do Lácio e depois da Itália, a ab urbe condita. A Urbe se tornou caput mundi, descendentes de Enéias e dos deuses Venus, Marte e Júpiter. Fábula ou não, trinta mil anos antes da fundação aquela terra já era habitada pelo homem, do tempo da Idade da Pedra.
  Estudiosos falam da época de 2000 a.C. quando dos Alpes chegaram outras tribos vindos da Europa Central que construíram suas habitações em palafitas. Introduziram novidades, como trabalhar matérias brutas, de cultivar o solo, de tecer panos e de cercar suas aldeias com bastiões de barro e de terra batida. Pouco a pouco desceram ao sul e fundaram Vilanova, se tornando num centro de uma “nova civilização”. Dela se originaram os úmbrios, os sabinos e os latinos.
  Não se sabe o que os vilanovianos fizeram com os indígenas, chamados “bárbaros” Podem ter se misturado e fundaram muitas aldeias entre o Tibre e a baia de Nápoles, por volta de 1000 a.C. Entre essas cidades estava Alba Longa, capital do Lácio (Castel Gondolfo). Dali, um punhado de jovens aventureiros migraram rumo ao norte e fundaram Roma.
  Não se sabe bem o motivo do deslocamento deles. Talvez foram espionar o local que fazia fronteira com a Toscana onde havia desembarcado uma nova população conhecida como etruscos, muito mal falados. Entre esses pioneiros, podiam estar Rômulo e Remo. O lugar ficava a uns 20 quilômetros do mar. Os charcos e os pântanos condenavam à malária, mas haviam as colinas que os protegiam dos mosquitos, como o Palatino.
  Para povoar o local precisavam fazer filhos, mas faltavam mulheres. Voltando à lenda, o chefão conseguiu mulheres para si e seus companheiros. Anunciaram uma grande festa e convidaram os sabinos, seu rei Tito Tácio e suas filhas. Durante a festa e a disputa de corridas, os donos da festa raptar as moças, como no caso de Helena que terminou na destruição de Tróia.
 No outro dia, seus pais e irmãos voltaram para libertar as mulheres. Entrincheiraram no Capitólio e cometeram o erro de entregar a chave da fortaleza para Tarpéia, uma romana apaixonada por Tito. Ela abriu as portas aos invasores. Estes, não gostando de traição, a esmagaram. Depois tudo acabou num banquete, e as mulheres se colocaram entre os dois exércitos. Rômulo e Tácio decidiram governar juntos, como reis das duas tribos (romanos Quirites). Tácio morreu.
Tudo pode ter sido uma cerimônia nupcial combinada, ou, em outra versão, coisa de patriotismo para dizer que os sabinos conquistaram Roma. De qualquer forma, existia a ameaça de um inimigo comum que eram os etruscos que, a partir de Tirreno, se espalhavam pela Toscana e pela Úmbria. Roma e a Sabina estavam na rota deles. A Urbe teve que encarar esses difíceis rivais durante toda sua história, por meio das guerras e da diplomacia.

sábado, 19 de janeiro de 2019

RICARDO DE BENEDICTIS - CRÔNICA

PERDAS IRREPARÁVEIS
Ricardo De Benedictis
Ricardo, Heleusa e Vicente na ACL em 2013
Estes primeiros dias de 2019 nos reservaram algumas perdas que julgávamos fora de qualquer propósito.
No noticiário desta sexta (18), a morte de Marciano, aos 67 anos, que fez dupla com João Mineiro e depois com Milionário, autor de importantes canções do estilo ‘sertanejo’.
As perdas, porém, vêm sucedendo a galope, como num turbilhão de azares para a Cultura, tão necessitada da presença física dos seus maiores expoentes.
Aqui em Conquista, perdemos a nossa querida Heleusa Figueira Câmara, que conhecemos desde que iniciamos nossa vida cultural por estas plagas, no final da década de 1970. Juntos fomos fundadores da Academia Conquistense de Letras, em 1980 e do Conselho Regional de Cultura, este último, o primeiro de uma série que criamos nos anos 1990.
Além do mais, éramos amigos, até o último instante, embora politicamente contrários, sem jamais ter discutido ou mesmo trocado idéias sobre ideologias.
Heleusa sucedeu Erathosthenes Menezes na presidência da ACL, em 1986. E eu fui seu sucessor em 1990.
Cedemos para ela o espaço ‘Pró-Memória’ do Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima para que instalasse a sede do PROLER, que até hoje ali permanece. Ela freqüentava minha residência e eu a visitei em sua casa algumas vezes.
Escritora, com dois livros publicados, fundou o Museu Regional da UESB, localizado na Praça Tancredo Neves, que aproximou muito a comunidade conquistense daquele ‘dinossauro’ à época, distante 7 Kms. do centro da cidade.
Além de freqüentar as reuniões dos Vilaça, Plínio Doyle da Academia Brasileira de Letras, no Rio, realizadas aos sábados. Ela se deslocava de Conquista para embelezar o ambiente carioca com sua fala mansa e alma de artista.
Viajou sem combinar, de uma hora para outra e deixou órfã toda a comunidade carente de saber que ainda persiste em Conquista.
Deixou Fe iluminar a alma dos presidiários que ‘assistia’ com a disseminação do gosto pela leitura e fez chegar em muitos lares o maior presente que alguém pode receber: o livro. Só por esse belo trabalho comunitário ela já se eternizara
Como diria o poeta Castro Alves, em seu poema ‘Vozes da América’:
Oh bendito que semeias/Livros, livros a mão cheia/E manda o povo pensar./O livro caindo n’alma/É germe que faz a palma,/É chuva que faz o mar.
Heleusa está para Conquista, assim como Atena para os gregos, Minerva para os romanos.
Descanse em paz, querida amiga!

NANDO DA COSTA LIMA - CRÔNICA


Deu Tudo Errado
 - Antero, cê tá ficando doido?
 - Por que doido mãe?
- Essas roupas de fazendeiro, isto deve ter custado os olhos da cara, quanto foi isso?
- Sei lá, nem tô fazendo conta, o retorno vai compensar!
- Que retorno? Você tá pensando que a televisão vai te contratar só porque você vai se fantasiar de cantor sertanejo?
- Não é nada disso, eu comprei essas roupas pra tirar o pé da lama, vou aplicar o golpe do baú, gastei meu dinheiro todo nesse traje, só ficou o que dá pra eu mandar fazer um book.
- Que diabo é isso?
- É um tipo de álbum mãe, todo artista faz.
- Mas você nunca foi artista.
- É aí que está meu plano! Semana passada eu estive em Itapetinga, e conheci uma moça cheia da grana, não é lá muito bonita, mas os bois do pai dela compensam qualquer feiura.  Só que o velho só quer saber de genro fazendeiro. Eu já falei pra ela que meu pai é dono de metade do Mato Grosso, isto antes de dividir.
- Mas como é que você foi achar seu pai? Nem eu sei quem é!
- Isto é só parte do plano, depois que eu mandar os retratos ele vai cair como um pato.
- Retrato? Eu não tô entendendo nada!
- É o seguinte, eu vou aproveitar a exposição e tirar umas fotos ao lado dos animais mais bonitos que tiver, depois é só mandar fazer um pôster do que ficar melhor e mandar pra Nalvinha, o velho vai pensar que os bois são meus. Com um pai dono de metade do Mato Grosso e criando gado daquela qualidade, ele é que vai apressar o casório.
- É meu filho, tomara que tudo saia bem, só assim eu vou ter meu sítio.
- Sítio não mãe, uma fazenda cheia de nelore, quando o velho descobrir que eu sou um duro, Nalvinha já vai estar com um neto dele no bucho. Depois é só botar o nome dele no moleque que tudo fica resolvido.
- E se ele mandar te matar?
- Mata nada, ele é muito orgulhoso pra querer um neto sem pai!
       No dia de por o plano em prática, Antero passou mais de uma hora debaixo do chuveiro, o traje já estava em cima da cama, chapéu, jaleco, camisa quadriculada, calça lee e bota cano longo. Tudo da melhor qualidade, não pegou nem ônibus, foi de táxi pra não sujar a roupa.
      Depois de rodar o parque todo e olhar boi por boi, ele escolheu o que mais lhe agradou, era um garrote imenso. E foi esse boião que atrapalhou a vida dele. Quando Antero ficou ao lado do touro pra ser fotografado, o bicho se virou e deu uma cagada que melou ele do chapéu panamá às botas cano longo, estas por sinal ficaram cheias, o boi tava com uma disenteria tão “braba” que só saiu aquela água preta, pelo cheiro parecia até que era de gente. O fotógrafo procurou arrumar as coisas pra não perder o freguês, tentou convencer Antero a tirar as fotos mesmo melado, além disso, cheiro não sai em retrato. Era até melhor pra enganar a futura noiva, ia parecer que ele tava trabalhando no curral da fazenda do pai. Ele achou que aquilo só podia ser gozação, pegou o coitado e esfregou a cara no estrume que restou no chão, a polícia passou na hora, só não prendeu os dois pra não sujar a viatura e olha que ele desejou ser preso, seria bem melhor! É que quando começou a tirar o grosso pra poder voltar pra casa, deu de cara com Nalvinha e o pai, quando ela o viu naquele estado, colocou o lenço no nariz e perguntou: - Ué Antero, eu pensei que você estava no Mato Grosso, o que você tá fazendo todo melado de estrume encostado no garrote campeão de papai??? – Ele ficou mudo de nervoso, não tinha onde enfiar a cara. Ela notou seu constrangimento e mudou a conversa, fez de conta que nada tinha acontecido e pra dar um ar de naturalidade e aliviar a tensão, chamou o pai pra mais perto e apresentou Antero: - Esse é o rapaz que eu falei pra mamãe que estava gostando- O velho franziu a testa e resmungou de cara feia: - Quando sua mãe me falou que o caça-dotes que estava dando em cima de você tava numa merda, eu pensei que era só força de expressão...

JEREMIAS MACÁRIO - CRÔNICA

OS QUE SE FORAM PERMANECEM
VIVOS EM NOSSA MEMÓRIA CULTURAL
Jeremias Macário
Nos últimos anos, principalmente do ano passado para cá, muitos incentivadores, pensadores e defensores da nossa cultura se foram, deixando uma lacuna em Vitória da Conquista, mas essas pessoas vão permanecer vivas em nossas mentes, com mais forças para continuarmos firmes nesta jornada que, infelizmente, conta com poucos apoiadores.
Com seus passos de sabedoria e desapego, essa gente deixou suas marcas registradas num trabalho incansável de promoção da cultura, por amor, sem interesses pecuniários. Mesmo sem o devido reconhecimento de gratidão de boa parte da sociedade, devemos seguir suas pegadas e nunca negar aos outros o conhecimento que aprendemos da escola acadêmica e da vida, esta a mais consistente e duradoura. Têm muitos que morrem como fantasmas.
  A lição que nos deixam é nunca sermos egoístas, mas persistentes nos momentos mais críticos e difíceis, porque não faltam aqueles que torcem a cara e acham que os fazedores de cultura não passam de idealistas sonhadores, desprovidos de bens materiais e sem futuro. São os mais ricos e os menos valorizados. Nessa caminhada, são muitos os que só dão espinhos e poucos os que oferecem flores. Uma só pétala já basta para superar sacrifícios e não ser apenas um vulto nesta multidão.
  Já dizia um filósofo que a vida é um bem incerto, e que a morte um mal certo. Mas, do incerto você pode fazer muitas coisas certas e tornar a morte um bem para cada alma que fica. Fizeram-nos bem as últimas pessoas que se foram, como o jornalista e historiador Luis Fernandes que sempre se mostrou preocupado em resgatar a nossa memória cultural, pesquisando e levantado dados da nossa história.
  Há cerca de um ano, ou pouco mais que isso, partiu para o além o meu amigo e companheiro poliglota e intelectual Sérgio Fonseca, com o qual convivi no jornal “A Tarde” e tive a honra de substituí-lo na chefia da Sucursal desse impresso em Vitória da Conquista. Quando se foi, infelizmente era pouco conhecido, inclusive de grande parte da mídia, mas, com seus serviços prestados, nos deixou um grande cabedal. Pouco foi homenageado em vida e na morte.
  Infelizmente, nosso sistema social e político tem como uma de suas péssimas características não valorizar a meritocracia. As pessoas mais preparadas são pouco aproveitadas. Recentemente, partiu também para o outro lado, a nossa guerreira e professora do projeto Proler, Heleusa Câmara, uma insistente na luta pela alfabetização de detentos e de todos aqueles que viviam à margem do ensino. Foi uma grande incentivadora da leitura, justamente nesses tempos tecnológicos da internet em que poucos têm o hábito de ler.
Quantas pessoas Heleusa tirou da escuridão da vida, para ver o mundo de outra forma, através do conhecimento! Não somente isso, ela com sua crença naquilo que fazia, devolveu à comunidade muita gente que vivia fora dela. Lembro dela em minhas entrevistas jornalísticas quando detalhava minuciosamente, com sua paciência, suas propostas de tornar as pessoas mais humanas e educadas.
  Nesta semana, lá se foi, mas continua conosco, o nosso “Fera”, como assim tratava os amigos, o ator Gildásio Leite. Minha aproximação com ele não tinha muito tempo, mas foi o bastante para aprender com Gildásio muita coisa, como bondade e generosidade, sem falar na sua ponderação na análise de certos problemas.
  Há uns três anos, viajei com ele e o professor Itamar Aguiar, para uma feira do livro em Lençóis, na Chapada Diamantina, onde ele aproveitou para realizar uma série de entrevistas com o cineasta Orlando Sena. Foi quando trocamos muitas ideias tomando umas geladas e passei a chama-lo de grande garimpeiro. Não se queixava, e sempre estava otimista com a vida. Na última vez em que nos falamos, pediu meu livro “Uma Conquista Cassada” para extrair alguns subsídios para um documentário que estava elaborando. Não me recordo agora o assunto. Gildásio divulgou muito Conquista nos filmes e nas peças em que participou

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

BIG BEN - CRÔNICA - HISTÓRIA

Décima primeira praga do Egito!BIG BEN
De repente ela chegou! Sorrateiramente, devagar, devagarinho, sem pedir licença, não mostrou a sua cara, não disse a que veio, simplesmente, tomou conta do meu corpo, do meu espírito, enfim, da minha vida. De repente o meu intestino já não era mais o mesmo, já não era mais confiável, já não era mais o meu amigo, muito pelo contrário, havia se transformado no meu pior pesadelo digno dos filmes da série de terror A hora do Pesadelo.

O meu lugar preferido da casa passou a ser um lugar decorado com os seguintes acessórios: Box, pia e, fundamentalmente, vaso sanitário. Ou seja, a minha vida se resumia a visitar este cômodo da casa com tanta freqüência que se fosse cobrado pedágio para a utilização deste aposento, com toda certeza, eu estaria à míngua. Demorou um certo tempo para eu entender que desta vez, estava lidando com um adversário com super poderes, poderes estes, de fazer inveja a qualquer personagem dos filmes do X-men. Já quase sem forças e esperança de dias melhores, fui obrigado a visitar aquele "cara de roupa branca" que não faz parte da minha agenda de prioridades.

Já bem instalado no consultório do homem de branco, sem papas na língua, o mesmo me disse: Meu amigo, de acordo com o seu quadro sintomático, o senhor pode estar com uma encrenca bem grande ou uma encrenca de gravidade menor, e completou, o senhor vai ter que fazer uma série de exames. Muito bem! Lá fui eu marcar os tais exames. A lista de exames tinha de tudo, desde um simples hemograma até um exame que até então não fazia parte do meu currículo, uma tal de colonoscopia. Pensei? Será que é aquilo o que eu estou pensando? Era exatamente aquilo!

Para quem não sabe, colonoscopia é um exame para verificar a saúde do intestino. O seu protocolo consiste em fazer um jejum de 24 horas à base de dieta líquida sem resíduos e esperar a hora  para ser literalmente entubado por baixo. Para a realização deste exame, um tubo é introduzido no seu intestino. E adivinhe por onde? Preciso responder? Mas, meu amigo, caso você tenha que ser submetido a este exame, não se preocupe muito. Na horaH, na hora da onça beber água, ou seja, na hora do exame, o enfermeiro vai lhe aplicar na veia um sedativo  e você vai dormir como uma bela adormecida. Ainda bem!

Vamos resumir um pouco essa tragédia grega! Chegou o dia de retornar ao médico. Chegou a hora da verdade! O Doutor após a avaliação minuciosa dos exames, me disse aliviado: O senhor tem uma encrenca no intestino, mas, não é uma coisa grave. Mas com certeza, é a coisa mais chata do mundo, ou melhor dizendo, do sistema solar, ou melhor dizendo, do universo, e arrematou: o senhor tem a SII.Tá bom! Afinal de contas, o que significa esta sigla? Para quem não sabe, SII significa: Síndrome do Intestino Irritável. O próprio nome já diz tudo. É uma disfunção do intestino que atazana a vida das pobres almas que foram agraciadas com este presente dos infernos. Pois bem, a minha era a pior, a tal da SII com disenteria.

A disenteria dessa famigerada SII acontece em doses homeopáticas, ou seja, a cada instante você tem a sensação que vai se borrar todo. É um tormento perpétuo durante 24 horas. Basta de falar de merda! O gozado dessa disfunção é que em pleno século 21, os médicos estão mais perdidos do que cachorro em caminhão de mudança.Uns dizem que é de natureza emocional, outros de natureza orgânica, outros nem sequer se manifestam, tamanha total falta de esclarecimentos a respeito dessa décima primeira praga do Egito.

Resumindo, depois de muitos testes cheguei a seguinte conclusão:  com essa disfunção, o meu intestino ficou totalmente intolerante a uma série de alimentos, principalmente, alimentos à base de leite e seus derivados. É assim que eu tenho vivido nestes últimos 2 anos da minha vida, com muitas reservas nutritivas, para se ter o mínimo de bem-estar.

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

NANDO DA COSTA LIMA - CRÔNICA

ARMADO ATÉ OS DENTES
Nando da Costa Lima  
Deixa do jeito que tá... Arma é problema! Todo mundo tem um cunhado doido, um parente deprimido, um sobrinho esquentado, uma criança querendo mostrar o 38 do pai. Todos eles não irão deixar de pegar essa arma se estiver fácil, e é claro que sempre haverá um vacilo. Mas, se você é a favor da liberação do porte e da posse de arma, você tem que pensar nisso tudo. Tá na cara que uma arma trancada num cofre não vai defender você de ser tomado de assalto dentro de sua casa. Então a arma só vai servir pra você arrotar valentia se for brabo. Servirá também pro corno psicológico ameaçar a mulher sempre que tomar uma, isto se não ocorrer o pior. Só nesse ano, antes do decreto liberando a posse de arma ser assinado, já houve vários crimes de feminicídio. Imaginem o reveillon do ano que vem. Nem precisa esperar tanto, o carnaval está chegando, e quando chegar, vai ficar mais fácil comprar uma arma. E é claro que quem compra uma arma não vai deixar a “bixinha” sozinha em casa; é claro que depois do quarto uísque vai se lembrar da bixinha, e pular atrás de um trio elétrico desarmado é um absurdo (pra quem está bêbado). É por essas e outras que eu sou a favor da proibição das armas para a sociedade civil. Não que eu seja contra as armas. É claro que elas nunca vão deixar de existir, mas como um instrumento de trabalho para profissionais treinados. Se os bandidos conseguem surpreender até os policiais, imagine um civil. O maior problema da arma é que o sujeito quando o coloca na cintura, não tem a mínima noção do que é tirar uma vida humana. Saem mostrando o cabo do revólver por qualquer motivo... E quando bebem, aí é que mora o perigo. Tem gente que acorda de ressaca sem saber que na noite anterior atirou num amigo por um motivo torpe...  Aí, se o sujeito for bom, fica com a consciência tão abalada que não presta mais pra nada. Caso ele não valha o que come, fica um tempo sentindo o ocorrido, depois passa a repetir os mesmos erros, e ainda fala: “Se eu já matei um amigo, imagina os inimigos”. Como se fosse o máximo.
As armas, usadas pelos homens, foram planejadas pelas forças inferiores. Acho que não! O ser humano é capaz de tudo, não precisa nem de força ruim... O homem tem que ser forte para praticar o bem, é uma labuta você ser gente boa no meio de tanto filho da puta ruim. A maioria das pessoas de bom senso sabe que esta facilitação da posse de armas só vai fazer bem pros bandidos e pros fabricantes de armas. Numa casa desarmada, os bons flúidos transitam mais intensamente. As armas foram criadas para abater o teu próximo, isso não é bom. Onde existem armas, a negatividade se sente em casa, os arrogantes se tornam mais arrogantes, e estes sempre acharão alguém para medir forças... Mas é assim mesmo, tem gente que, apesar de sere obcecado por armas, não assimilarou a máxima “Se puxou do punhal, tem que sangrar”. E aí você sabe no que dá! Mostrar o cabo do revólver quando se está bêbado nunca matou ninguém, muito pelo contrário. O povo brasileiro vem sendo vítima de violência devido à falta de investimento em educação. Com o dinheiro que se gasta comprando um revólver, educa-se pessoas. Mas, infelizmente, se esse decreto sair (como já é quase certo), os fabricantes de armas e de cofres vão faturar... E os bandidos vão ter certeza que quem compra um cofre tem uma (ou algumas) armas, prontas para serem roubadas... O chefe da casa viajou, ele só tem posse não pode levar o arsenal no carro... Não seria melhor deixar do jeito que tá? Isso é igual merda: se mexer, fede mais ainda.
E a involução espiritual? Não é péssimo?

sábado, 12 de janeiro de 2019

NANDO DA COSTA LIMA - CONTO

BEIJINHO DOCE
Nando da Costa Lima
Tonhão sim era um sanfoneiro retado, tocava qualquer música! Pra animar uma festa não tinha melhor. Só não era mais requisitado por ser muito bonito e charmoso ninguém queria ele perto de suas mulheres, era uma tentação, além de tocar e cantar, ainda era um poeta! Não tinha mulher que não se abria depois de dez minutos de conversa. Quando ia tocar em qualquer festa, os maridos não apartavam das esposas, estas até gostavam, só assim para terem atenção. Tonhão não deixava por menos, gostava de cultivar a imagem de galã. Toda música que tocava fazia questão de dedicar a um “alguém”, e nunca falava o nome desse “alguém”.
      Era um mistério regional..., mas todo mundo achava que era mulher casada, e bem casada! Todas as mulheres saíam das festas sentindo-se este alguém. Em maio, Tonhão foi contratado pra animar uma festa na casa de seu Teotônio Boca de Ouro, ia ser um festão, o homem tinha dinheiro pra jogar fora. Ia matar dois bois erados, fora a feijoada completa para 500 talheres. Ciente de que a feijoada pra ser completa tem de ser acompanhada pela Jurubeba Leão do Norte, comprou logo uma carga. Tudo isso pra comemorar o primeiro ano de casamento com aquela beleza, 30 anos mais nova que ele. Pra você ter uma ideia, tinha até deputado na festa. O sanfoneiro sentiu que aquele era o seu dia, e aproveitando a atenção dispensada, largou logo seu slogan: “Obrigado minhas fãs, amo todas vocês, mas meu coração já pertence a um alguém”.
      Depois disso ele já entrou na sala tocando uma valsa em homenagem ao alguém. Tava tão alegre que exagerou na cachaça, bebeu pra entortar, nunca tinha sido visto naquele estado, só tava aguentando cantar por força do hábito. O romantismo de Tonhão tava tão exagerado que já tinha uns dez querendo quebrar a sanfona e o dono. E se o deputado não fosse um corno letrado já tinha metido a mão na perua da mulher, toda hora que começava uma música ela ensaiava um desmaio.Mas o bicho pegou mesmo quando Dona Marilane, esposa de Teotônio Boca de Ouro entrou na sala. Foi um sucesso, aquela lindeza de minissaia com aquelabunda bem esculpida fez o sanfoneiro engasgar e errar o tom. Aquilo fez o pessoal pensar que era ela o “alguém” de Tonhão, se fosse mesmo a coisa ia feder defunto. Boca de Ouro já tinha despachado quatro só por terem sido ex-namorados de Marilane. Imagine o que não faria com quem mexesse com ela em público. O pessoal já olhou pra Tonhão como se ele fosse um defunto. E ele, movido pela pinga, não parou de fazer pose e cara de mal pra dona da festa, virou outro copo de pinga, cheio! E disse seriamente olhando no fundo dos olhos de Marilane: “Hoje eu revelo quem é o alguém de minha vida!”. Quando acabou de falar, Boca de Ouro, que também já se encontrava bêbado, pulou no meio da sala com um revólver em cada mão, deu um tiro na caixa de sanfona e ameaçou Tonhão: “Se você não cantar ‘Beijinho Doce’ antes de revelar nosso ‘love,’ eu lhe dou um tiro, Mô...” (fazendo biquinho).
      A decepção tomou conta da festa, em poucos minutos a mulherada apagou a imagem de galã que há dez anos ou mais povoava seus sonhos. Todas se achavam o alguém. Os homens também não deixaram de se decepcionar. Teotônio Boca de Ouro era ponto de referência quando se tratava de valentia..., só ficou o trauma!

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

JEREMIAS MACÁRIO - HISTÓRIA (FINAL)

AS CURIOSIDADES DO MUNDO GREGO –
FILOSOFIAS E SABEDORIAS (parte final)
Jeremias Macário
ARISTÓTELES –Além de ficar de luto, Aristóteles elevou um altar em honra ao seu mestre Platão. Foi seu aluno durante vinte anos. Sua preferência era a matemática. Escreveu prosa embaralhada e complicada, cheia de divagações literárias e iluminações poéticas – assim descreve Indro Montanelli, autor de “História dos Gregos”.
Sobre Platão, é difícil resumir a doutrina do filósofo. Nietzsche chamou-o de pré-cristão por certas antecipações teológicas e morais. No campo moral era puritano. Em política foi totalitário que, “se vivesse hoje receberia o prêmio Stalin”. Afirmava que a disciplina vale mais do que a liberdade de pensamento e que a justiça é mais necessária do que a verdade.
Quando Platão morreu, Aristóteles emigrou para a corte de Hermíades, pequeno tirano da Ásia Menor e casou-se com sua filha Pítia. Ia ali fundar uma academia, mas vieram os persas e mataram o rei. Aristóteles conseguiu fugir para Lesbos. Em 343 a.C. Filipe, da Macedônia, o chamou para Pela para educar seu filho Alexandre.
  Cumpriu tão bem sua tarefa que Filipe o fez governador de Stagira. Gostaram tanto da sua atuação que transformaram a data de sua nomeação num acontecimento festivo. Com senso claro de divisão de trabalho, reuniu seus alunos em grupos, confiando a cada um uma tarefa escolar bem definida.
Era reservado, metódico e preso ao horário como um burocrata. Ensinava passeando com os alunos ao longo dos pórticos que circundavam o liceu. Por isso que sua escola se chama peripatética (ambulante). Foi o primeiro a tentar uma classificação das espécies animais, dividindo-os em vertebrados e invertebrados. Tinha um fraco pelos anéis, com os quais enchia os dedos até os fazer desaparecer completamente.
Na política propôs uma timocracia, uma combinação de democracia e de aristocracia, garantindo o governo de pessoas competentes e reprimindo os abusos de liberdade. Quando Alexandre, o Grandemorreu, ele foi acusado de impiedade. Aristóteles compreendeu que a defesa seria inútil e abandonou a cidade. Não quero que Atenas se manche com um delito contra a filosofia. À revelia, o tribunal condenou-o à morte. Pouco tempo depois morreu, não se sabe se por doença de estômago ou por cicuta, como Sócrates.

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