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sábado, 27 de outubro de 2018

NANDO DA COSTA LIMA - CRÔNICA


Acauã
Nando da Costa Lima
 Na nossa Vitória da Conquista do presente o acauã só é parte do passado... Mas antes, quando as matas do Sudoeste baiano ainda eram densas, ela era a vidente do sertanejo, uma ave mística! Era quem previa o bem ou o mal quando estavam por vir, o acauã dava seu aviso quando fazia pouso nas gameleiras, e era aí que estava toda a “ciência”! Qualquer sertanejo que se prezasse sabia quando o acauã cantava num galho seco da gameleira é porque o anjo da morte estava por perto. Da mesma forma também sabiam que quando este canto partia de um galho verde era sinal de farturas e alegrias. Hoje em Conquista não existem mais Acauãs nem gameleiras, mas ficaram as histórias onde estes sempre tiveram presentes...
  Uma vez, há muito tempo atrás um fazendeiro adoeceu gravemente. O velho, que era muito supersticioso, chamou os dois filhos e pediu que não deixassem as Acauãs fazerem pouso na grande gameleira que sombreava o casarão. No início os filhos pensaram em derrubar a árvore. Mas esta ideia foi posta fora de prática pelo próprio velho, pois se tratava de uma árvore secular que três gerações de sua família vinha conservando. Era um marco! Sendo assim, a única forma encontrada pelos rapazes de evitar o pouso nas árvores foi mandar exterminar todas as Acauãs encontradas na região, chegaram até a pagar os caçadores para incentivar a matança. Enquanto o velho sofria na cama, os filhos se revezavam armados em frente a gameleira pra no caso de algum acauã tentar pousar. E o velho definhava cada vez mais...  Um dia chegou um caçador e garantiu que num raio de seis léguas não existia umo acauã. Tinham sido todas caçadas como foi mandado. Os filhos do velho respiravam aliviados... Mas o sofrimento do pai se tornou uma tortura para todos, era contagiante, eram noites e dias de gemidos e gritos de dor. Chegou um tempo que a morte seria um alívio, foi só aí que o velho entendeu que ninguém pode interferir no destino, e pediu aos filho que capturassem algumas Acauãs nos lugares que não foram caçadas e soltassem em volta da casa... Só depois que o acauã cantou no galho seco da gameleira que sombreava o casarão da fazenda é que o dono descansou em paz...
Desde “minino” que gosto de inventar estória. Tanto era, que Dr. Mármore Neto (pai de Murilo prefeito) que na época era Juiz em Conquista, todo fim de tarde trazia doce só pra me ver contando mentira. Nós éramos vizinhos e uma vez eu escutei ele falar pra meu pai que eu daria um bom advogado, nunca tinha visto alguém mentir com tanto entusiasmo. Mas isso não vem ao caso, eu tô falando é de Acauã..., E na minha infância o progresso já tinha acabado com as matas e com os Acauãs. Mesmo assim a expressão ainda era usada pra definir os bons e os maus acontecimentos. Como na “reforma” de 64 quando o acauã cantou no alto do galho seco de uma gameleira e este canto ecoou com bastante intensidade aqui interrompendo uma grande caminhada que só veio a ser retomada 18 anos mais tarde (com muito brilhantismo). Uma época de grande beleza na política conquistense (antes vista como reduto da oposição)...Ele cantou no quintal da viúva Lourença e também num galho seco do terreiro do coronel Domingos Ferraz nos idos de 1895, quando por vingança foram mortas 22 pessoas de sua família, inclusive ele (Tragédia do Tamanduá). Mas o acauã também já cantou nos galhos verdes atraindo felicidade através dos tempos, é porque pouca gente viu! Mas tenho certeza que toda vez que aqui nascia ou chegava alguém como Maneca Grosso, Glauber Rocha, Íris Silveira, Erathóstenes Menezes, Camilo de Jesus Lima, Yolando Fonseca, o acauã cantava em harmonia com a vida, do galho mais verde e vistoso da gameleira.

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