NANDO DA COSTA LIMA

Quando
Climério atravessou a mata que separava a casa de Vitalino do resto do mundo,
tava decidido. Nem o vento forte roçando nas árvores e assoviando como se fosse
gente assustando sua montaria o desanimou. Vitalino já estava na porta da casa
quando ele chegou, pareceu até que já esperava. Quando Climério contou pra
Vitalino que, custasse o que custasse, ele queria aprender uma reza pra
“invutar” abrir o cofre da prefeitura e recuperar suas escrituras. O curandeiro
logo se prontificou a ajudar, isto se ele estivesse disposto a se desfazer da
montaria e de algum dinheiro. Climério concordou de imediato e foi sentado num
pilão num terreiro varrido por arruda e lavado com sal grosso que Vitalino deu
a receita: “Inhozin pega um gato preto e bota pra cozinhar durante três dias e
três noites, quando a carne separar dos ossos você pega a ossada e, na meia
noite de uma sexta-feira, joga na correnteza de um rio. O osso que subir é a chave
que você tá precisando, abre qualquer fechadura e você ainda ‘invurta’ (fica
invisível)”. Climério anotou aquilo tudo e voltou pra casa satisfeito, nem
notou a caminhada.
O difícil
foi arrumar um gato totalmente preto, mas logo que achou ele preparou a
receita. Quando jogou a ossada do gato na correnteza, não se sabe por que, os
ossos menores desceram rio abaixo enquanto que o espinhaço de gato inteiro
subiu. Climério pegou aquilo, colocou num embornal e partiu pra prefeitura.
Primeiro tentou abrir a porta da frente, não teve jeito, mas aí ele se lembrou
de que a receita era pra abrir o cofre. Arrombou a porta e quando tava se
aproximando do cofre crente que tava invisível, a polícia chegou e prendeu o
arrombador. A sorte foi que quandoele confessou que queria abrir o cofre com
aquele espinhaço de gato o juiz achou que era coisa de doido e mandou que o
soltassem. Climério saiu da cadeia com tanta raiva que foi bater na casa de
Vitalino no mesmo dia. Quando o curandeiro viu a cara de raiva do fazendeiro
segurado aquela ossada, foi logo se adiantando: “Já sei, o trabalho não deu
certo e o senhor veio aqui me fazer comer esse espinhaço de gato”. Aí Climério
respondeu com mais raiva ainda: ”QUEM FALOU EM COMER?”.
Vitalino ficou num estado que não puderam nem trazer
pra Conquista, foi o jeito mandar buscar um doutor. E o pior é que falaram que
era um problema de osso e em vez de levarem um cirurgião, levaram um
ortopedista pra remover o espinhaço de gato de dentro do rabo do curandeiro. O
Dr. passou o maior aperto pra desentupir Vitalino no meio daquela mata que nem
energia tinha. Hoje Vitalino não tira quebrante, não reza espinhela caída, não
“invurta” e não pode ver um gato preto que arrepia até os cabelos da
sobrancelha.
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