“ELE NÃO TEM CARÁTER”
Ricardo De Benedictis
Lembro-me de um dos programas ‘RODA VIVA’, da TV
CULTURA/SP, quando o entrevistado foi o grande escritor baiano, João Ubaldo
Ribeiro, em uma das suas últimas aparições públicas, antes de falecer.
Na oportunidade, perguntado o que ele achava do
caráter de Lula, ele disse sem pestanejar: “Ele não é bom nem mal caráter, uma
vez que ele não tem caráter”.
Há poucos dias, perguntando a um amigo o porque de
outro amigo de papos não estar mais aparecendo para trocar idéias, ele disse-me
que o amigo sumido lhe explicara que não iria mais aos nossos bate-papos, uma
vez que “eu era muito certo de estar com a razão em tudo”. E que ele não
aceitava a minha posição.
No primeiro instante deixei passar. Depois fui pensar
sobre o assunto e concluí que não sou radical, mas ele sim. Verificando seu rol
de amizades, é fácil compreender. Um dos poucos amigos do grupo que não vota em
Partido, sou eu. No meu rol de amizades, convivo com pessoas que pensam
diferente, oferecem suas opiniões e mesmo que haja conflitos, nunca, nos meus
quase oitenta anos de idade, nunca deixei de ser amigo de alguém, apenas porque
pensa diferente de mim. Cheguei à conclusão de que o amigo em tela, é ‘o
esquerdopata’ de que tanto se fala e que eu tinha dificuldades de identificar.
Gostaria de encerrar essa reflexão garantindo de que
os radicais de direita e de esquerda sempre se distanciaram de mim. Minhas
opiniões são claras, não me julgo melhor nem pior, mas acho que há uma regra
que deve ser imutável na Democracia. Uma delas é a ‘convivência dos pensamentos
contrários’. Imaginem, amigos, que para manter uma amizade teríamos que abrir
mão da única virtude que nos levará ao túmulo: A CONSCIÊNCIA. Pois bem. Sinto-me
triste, mas não mais me abalam tais comportamentos. Se um dia ele reaparecer, e
acho que isso pode acontecer, o receberei de braços abertos, sem perguntar nada
ou repreendê-lo. Às vezes, necessitamos de uma espécie de ‘retiro’ para por as
coisas na ordem. Amigos de muitos anos não devem se deixar levar por paixões
meramente ideológicas para se afastarem.
Já perdi alguns amigos por falhas em compromissos,
grandes prejuízos, traições, etc. Perder amigo apenas por pensar diferente, é a
primeira vez.
La prima volta, como diria o italiano, meu pai.
Não sei se o amigo vai voltar. Espero que sim. Mas, de
antemão, garanto que não vou mudar meu pensamento sobre o que penso, a não ser
que seja convencido, no plano das idéias. No mais, peço a Deus que lhe dê
tirocínio, já que trata-se de uma pessoa culta e de certa inteligência, e que
possa voltar para nosso reencontro. Caso contrário, paciência. Não o ofendemos
pessoalmente, apenas temos pensamentos diversos sobre comportamentos radicais
da direita e da esquerda. Para mim, ambas são ridículas e eu não consigo
adotá-las.
Até a próxima.
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