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sábado, 10 de agosto de 2019

NANDO DA COSTA LIMA - CONTO

Destino

Nando da Costa Lima
Senta aí, “Dona Repórte”, eu vou lhe contar a história do início, isso que a senhora viu foi só um pedaço, ela ainda está acontecendo. Há dezessete anos esse bairro era mais mato que casas, foi então que apareceu Pedro e Rosário, eles tinham se juntado de novo, ela já tava pra parir. Rosário não tinha quinze anos quando o menino nasceu, Pedro tinha dezoito, e a criança escolheu o pior momento para vir ao mundo, ele tava desempregado há meses. Eu era a vizinha mais próxima e até ajudava quando podia, tinha que ser escondido dele, era tão orgulhoso que preferia passar fome que aceitar esmola de puta, era o que eu fazia na época. Quando a criança nasceu eu passei a ajudar com mais frequência, mas quando ela completou sete meses eu peguei uma “doença ruim” que me impediu de continuar fazendo vida.
Depois disso eu não pude fazer mais nada pelo menino. Pedro saía sempre em busca de emprego, mas a única coisa que conseguia era se embebedar, a cachaça era o único apoio que os amigos podiam lhe dar! Eu cheguei a dar conselho pra Rosário se prostituir, bebendo daquele jeito Pedro nem ia notar. Mas ela era tão inocente que ainda acreditava num grande futuro para os dois, era tão apaixonada pelo marido que nem passou pela cabeça aceitar a minha proposta. E a criança ia sobrevivendo aos trancos e barrancos, estava sempre chorando, e aquele choro diferente que denunciava a fome que às vezes era enganada com um pouco de farinha dissolvida em água. Um dia o desespero se apossou de Pedro, o menino tava pra estourar de tanto chorar e dessa vez nem farinha tinha pra enganar o estômago do filho. Ele saiu de casa garantindo pra Rosário que traria o leite custasse o custasse. Pedro não voltou, só chegou a notícia que mataram um ladrão no centro da cidade tentando roubar o depósito de uma loja de alimentos, segundo a polícia o gatuno estava com o roubo na mão, duas latas de leite em pó. Rosário nem pôde ver quando jogaram seu homem numa cova rasa. Logo depois ela entrou pra vida, era o único jeito de terminar de criar o filho, isto é, não deixar morrer de fome. Ela viveu mais uns seis anos até que um amante pôs fim em sua vida na frente do filho ainda criança. Eu sei, “Dona Repórter”, que a senhora deve tá sem entender porque eu lhe contei essa história, deve até estar pensando que eu não passo de uma prostituta aposentada querendo chamar sua atenção, mas não é nada disso! É que esta reportagem que a senhora tá fazendo sobre aquele rapaz de dezessete anos morto ao tentar roubar um supermercado é apenas a continuação da história que acabei de contar. Aquele rapaz que morreu é filho de Pedro e Rosário, que também tem um filho e uma mulher que a esta hora devem estar esperando pela comida prometida por ele antes de sair de casa….

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